RECORD – Foi despedido do Benfica porquê e por quem?
ANDRADE E SOUSA – Não se pode dizer que tenha sido despedido. Havia, por exigência minha, um contrato de prestação de serviços. Quando o clube quisesse ver-se livre de mim, podia fazê-lo sem constrangimentos nem cláusulas indemnizatórias, ao contrário do que acontece com muitos que por lá andam. O Benfica prescindiu dos meus serviços na sequência de um e-mail que enviei para a pessoa errada. A minha saída não se resume, contudo, a esse facto e é injusto passar-se essa imagem. Foi um pretexto, pelo que tenho o direito de me defender e não aceito ser tratado como um produto descartável.
R – Qual o teor desse e-mail? E por que fala em pretexto?
AS – Tecia considerações sobre as características profissionais do dr. Domingos Soares Oliveira [administrador executivo da SAD]. Ele teve acesso ao teor da mensagem e aproveitou-se disso para se ver livre de mim. O e-mail tinha como destinatário um amigo. Só que, por engano, enviei-o para um colega, Bernardo Faria de Carvalho [assessor da SAD], que, embora percebendo que não lhe era dirigido, submisso ao chefe, reencaminhou-o para Soares Oliveira.
R – A quem se destinava então o e-mail?
AS – Não vou dizer o nome do meu amigo. Quero protegê-lo e tratou-se de algo privado e confidencial. Nem o conteúdo do e-mail. Posso apenas garantir que não retiro uma vírgula ao que escrevi e que o mesmo tecia considerações de natureza exclusivamente profissional.
R – O seu “amigo” está ligado ao Benfica?
AS – Está ligado ao universo do Benfica.
R – É dirigente?
AS – Não.
R – O que se passou depois de Bernardo Faria de Carvalho reencaminhar a mensagem para Soares Oliveira?
AS – Acabou por ser Soares Oliveira a dar amplitude a esse facto. Depois de receber o e-mail do subordinado, revelou-o, desprotegendo inclusivamente o informador. Serviu-se do meu e-mail, de natureza privada, para exigir a minha cabeça numa reunião de direcção. Colocou-a entre a espada e a parede. “Ou ele ou eu”, chegou mesmo a dizer ao presidente.
R – Mas isso foi só um pretexto, segundo diz. Quer concretizar?
AS – Havia, há cerca de um ano, um grande desgaste na minha relação com o dr. Soares Oliveira, resultante do facto de criticar, interna e repetidamente, a presença de sportinguistas e portistas na estrutura profissional do Benfica. O dr. Soares Oliveira está no topo da pirâmide dessa estrutura e tem enorme poder e influência sobre Luís Filipe Vieira. O presidente dá-lhe esse estatuto e fala com ele vezes sem conta todos os dias.
R – Todos sabemos que Soares Oliveira é simpatizante do Sporting. Isso quer dizer que, na sua óptica, não serve o Benfica com competência?
AS – Não é uma questão de competência. Simplesmente, as grandes decisões do Benfica são tomadas por pessoas que não sentem o clube. Não gostam dele e movem-se por uma agenda própria. Hoje estão no Benfica, amanhã noutro lugar qualquer.
R – Soares Oliveira não gosta do Benfica?
AS – Não ama o Benfica como um benfiquista. Gosta daquilo que o Benfica lhe pode oferecer: notoriedade e um projecto profissional interessante.
R – As grandes decisões, segundo argumenta, são tomadas pelos profissionais de cúpula, curiosamente adeptos de outros clubes. Qual então o papel dos vice-presidentes, sabendo que foram eleitos, há um ano, seis elementos efectivos e dois suplentes?
AS – Um papel meramente decorativo. Luís Filipe Vieira nem sequer sabe os nomes de todos os vice-presidentes. Vi-o, há dias, a perguntar directamente o nome a um deles? Alguns são completamente marginalizados por uma estrutura profissional, que é necessária, mas que não pode desprezar os dirigentes eleitos.
R – Além de Soares Oliveira, quem mais toma decisões importantes ou tem grande influência sobre o presidente?
AS – O dr. Paulo Gonçalves [assessor jurídico da SAD], portista desde pequeno. Começou no departamento jurídico do FC Porto, com Pinto da Costa. Passou depois para o Boavista, na administração Loureiro. Eu próprio, pelo Benfica, e ele, ao serviço do Boavista, tivemos lutas enérgicas em reuniões da Liga. Trata-se de um portista da era Pinto da Costa, que já defendeu importantes posições contra o Benfica e que tem acesso, actualmente, aos documentos mais importantes e sigilosos da área jurídica do clube.
R – Ainda não colocou em causa o profissionalismo ou a lealdade de Soares Oliveira e Paulo Gonçalves. Trata-se tão-só de uma questão de princípio??
AS – Não coloco isso em causa, assim como eles também não podem questionar a minha honestidade e competência. Não me envergonho de nada que tenha feito. Mas os benfiquistas merecem saber o que têm em casa. Soares Oliveira exorbita funções. É um pequeno ditador que só sabe funcionar com pessoas submissas. Ele afasta todos os que são incómodos. Como eu era incómodo, benfiquista, e afirmava não gostar de sportinguistas e portistas à frente do meu clube, fui afastado.
R – Pelo cenário traçado, o Benfica parece estar em guerra aberta?
AS – Não diria guerra aberta. Mas existe, de facto, um clima de grande tensão no interior do clube.
1. Com um contrato de prestação de serviços não aceita ser tratado como um produto descartável. Mas o que é que queria com um contrato desse tipo, emprego para toda a vida?
ResponderEliminar2. Enviou um email com informação confidencial sobre o funcionamento interno do Benfica para a pessoa errada. É assim que aparecem as toupeiras. Mostrou falta de rigor profissional e falta de solidariedade institucional que deve existir entre colegas de profissão ou superiores hierárquicos. Eventuais atritos ou conflitos devem ser resolvidos dentro do clube, entre as pessoas envolvidas, entre conversas frente a frente, e não enviando a informação confidencial para fora da empresa para eventuais "amigos".
3. Claro que DSO deu relevo ao caso. Eu teria feito o mesmo e exigido exactamente a mesma coisa. É demasiado grave levar informação interna do clube para fora dele.
4. É lógico que as grandes decisões sejam tomados pelos profissionais da cúpula ou pela direcção quando se reúne. Queriam que fossem os tratadores da relva a fazê-lo? Sinto haver aqui uma grande dose de inveja, utilizando o facto do DSO não ser benfiquista, como argumento. A atitude certa é colocar, SEMPRE, o clube primeiro. E não foi isso que fez.
5. Lança suspeitas sobre os profissionais do clube, sugerindo o relativo risco de haver informação confidencial que mais tarde saia para fora do clube, quando é ele próprio que o faz. No entanto não coloca em causa a honestidade, competência e lealdade de DSO. Então o que coloca em causa, o seu sportinguismo?
6. Não se arrepende de nada do que fez, o que é grave, acusando a pessoa de quem não gosta, não por não ser competente ou desleal mas por ter, ou ter tido, outra preferência clubística (nazis, apartheid, someone?) de coisas que ele próprio fez, acusando-os de poder fazer o mesmo. E à falta de mais argumentação acusa-o de ditador, quando o homem se limita a defender os interesses do clube.
7. Uma pessoa intolerante, segregante (raça, sexo, preferência clubística ou sexual, etc), que não mostra solidariedade institucional não merece trabalhar dentro dessa organização. Para além de défice de profissionalismo e rigor, e de inteligência também, mostra uma personalidade e carácter que não abona a seu favor nem se coaduna com um trabalho dentro do Benfica. É uma pessoa perigosa.
8. Eu depois de tudo isto, e de ler alguns blogues benfiquistas, cada vez me convenço mais que os maiores inimigos do Benfica estão dentro do clube, são os próprios Benfiquistas. E são estes Benquistas ressabiados e frustrados que criam o mau ambiente e as eventuais guerras do alecrim e manjerona. E que tentam passar esta guerra de inveja, segregação e intolerância (exactamente aquilo de que acusamos os andrades), criada por eles, para dentro do clube. O que é pena.
Mentalidades...
Primeiro ponto: não concordo nem deixo de concordar com as opiniões de Andrade e Sousa. Trata-se apenas de verificar aquilo que diz no ponto 8 - aquilo que hoje em dia se discute sobre a existência de gente com outras preferências clubísticas, já era referido como um ponto central por Andrade e Sousa.
EliminarQuanto à entrevista propriamente dita, quero só referir alguns pontos:
1. a ideia da defesa não vem do contrato ser de prestação de serviços ou não, mas de certas informações erradas que vieram a público na altura e que convinha que fossem esclarecidas. Além de que um mínimo de ética profissional é, compreensivelmente, exigível em qualquer situação: por uma pessoa trabalhar a recibos verdes é um produto descartável?
2.Estar ligado ao Universo do Benfica quer dizer alguma coisa, não quer dizer que é apenas um "amigalhaço". Porque é que um amigo da primária se havia de interessar pela conduta profissional de Soares de Oliveira. Não ser dirigente não significa trabalhar no Benfica. Andrade e Sousa era director do departamento jurídico e não era dirigente. Parece-me óbvio que se trata de alguém que trabalha no Benfica, mas que também não queria ser queimado...
3. O problema de ter outra preferência clubística nunca é a preferência clubística em si: tem que ver com o facto de se achar que é uma condição necessária para exercer bem o próprio cargo. Eu não deixo de contratar alcoólicos para a minha empresa por ter alguma coisa contra alcoólicos, mas apenas por achar que isso é uma condição que invalida - mesmo que seja muito competente noutras coisas - o bom funcionamento em aspectos cruciais. E a acusação (que nem me interessa se é verdadeira ou falsa para o caso) não é apenas de ser de outro clube, mas de ter os interesses pessoais à frente dos interesses do clube.
4. A acusação de ditador, se for verdadeira (repito, não me interessa asseverar isso), é uma acusação válida por si. Por muito que uma única pessoa esteja a defender os interesses do clube contra a vontade das outras, está a destruir a identidade do clube, que é democrática. No Benfica, a democracia é um valor estimável só por si, o que tira legitimidade a qualquer acção ditatorial, por mais certa que seja.
5. A acusação de falta de argumentos não se coaduna com a acusação de deixar sair informação confidencial. Se não há argumentos é porque, precisamente, se procura evitar a saída de informação confidencial. E não chamemos segregante a alguém por causa disto, parece-me um certo exagero.
6. Obrigado pela intervenção e quero frisar que apenas pretendo promover a discussão honesta do Benfica e que não estou a defender opinião nenhuma. Volte sempre, foi um prazer conversar consigo.
Caro Catão, em primeiro lugar quero dar-lhes os parabéns por ter dado a oportunidade aos Benfiquistas anónimos, como eu, de ficar a saber o que pensam alguns benfiquistas que passaram por dentro da estrutura do clube.
ResponderEliminarEm segundo lugar quero dizer que não retiro nem uma vírgula àquilo que afirmei. Penso que as minhas opiniões são bem claras e não darão azo a más interpretações.
Em terceiro, afirmar que eu nunca faria o que fez esse senhor, isto é, dar uma entrevista a quem quer que fosse, lavando a roupa suja em público, pois se tivesse trabalhado dentro do Benfica nunca revelaria o que quer que fosse em público, especialmente se fosse algo de negativo para o clube. Defendo e sempre defendi que a roupa suja lava-se cara a cara, com os próprios intervenientes.
Bem haja!
Viva o Benfica!
PS. Chamar ditador a um ex-colega significa absolutamente nada. Não passa de demagogia barata e não tem absolutamente nada a ver com democracia.
As suas opiniões não darão, com certeza, azo a más interpretações. Mas gostava de saber, mais do que aquilo que acha sobre a pessoa - que nem eu nem o senhor(presumo) conhecemos - aquilo que acha sobre a presença de não-benfiquistas na direcção... Se pudesse dizer-mo, agradecia e poderíamos discuti-lo
EliminarSobre a pessoa entrevistada não vou falar pois não a conheço.
EliminarPor uma questão de princípio, e talvez por ter vivido grande parte da minha vida em países mais desenvolvidos em todos os aspectos e com outra mentalidade, não acho que a competência tenha passaporte ou cor, seja ela qual for.
Por isso, não sou contra o facto de haver pessoas com outras simpatias clubisticas a trabalhar no Benfica, assim como não sou contra o facto de haver jogadores a jogar no Benfica com outras simpatias clubísticas ou com outros passaportes, assim como não sou contra o facto de haver em Portugal profissionais a trabalhar com passaportes de outras origens. A competência não tem passaporte. Importante é a competência e o conhecimento que as pessoas acrescentam à organização.
O futebol em geral, e o Benfica em particular, não é propriamente os serviços secretos de de algum programa secreto de alguma potência mundial, um local onde se trabalhe em segredos de Estado à qual apenas sujeitos com a própria nacionalidade tenham acesso.
Logicamente isto não impede que não se tomem as precauções necessárias para que não hajam fugas de informação ou que estratégias e segredos que existem em TODAS as empresas sejam passados para a concorrência. Afinal, isto é uma questão que não é exclusiva do Benfica mas toca a todas as empresas. Eu sei bem do que falo.
Ninguém está livre que alguém passe para a concorrência e leve consigo informações secretas e importantes. Contra isso não se pode fazer nada. Mas podemos melhorar os instrumentos de gestão que o impedem. Como muito bem mostra a entrevista, são os próprios benfiquistas dentro do clube que são os famosos bufos, mostrando falhas graves na solidariedade institucional que deve existir entre as pessoas dentro de uma empresa.
Afinal já estamos no século XXI e não no século XIX, por isso temos de adaptar a nossa mentalidade aos tempos em que vivemos. É tudo uma questão de sobrevivência. A mim custa-me ver Benfiquistas a pensar como se ainda se vivessem nos princípios do século passado.
Ferve-me o sangue de indignação ver benfiquistas que, por razões particulares, quase sempre de inveja e egoismo, atacam o clube por ter uma gestão mais avançada do que a sua mentalidade esclerosada.
Tenho a certeza que num país do norte da Europa, por exemplo, esta discussão não teria acontecido porque as pessoas percebem logo. Embora casos como o da pessoa entrevistada aconteça em todos os países e em todas as organizações. Aliás, é um caso típico ("case study") de incompatibilidade profissional que se estuda em escolas de gestão há já algumas dezenas de anos.
E o que isso mostra é que quase sempre as razões apresentadas pelos "queixosos" nunca são as verdadeiras razões desses conflitos. É mais profundo do que isso. Não sei se me faço entender.
Apenas uma observação: porque será que últimamente certos blogues esforçam-se na promoção de entrevistas com "decidentes" da gerência de Luís Filipe Vieira?
ResponderEliminarPercebe-se perfeitamente o alcance da escolha a dedo dos entrevistados que na sua atitude transmitem um certo ressabiamento e, por outro lado, falta de ética profissional.
Percebe-se,Outubro está à porta e o desespero à flor da pele por falta de alternativas credíveis.Só pode ser isso.
O Manuel tem carradas de razão quando diz que os inimigos do Benfica estão dentro do próprio Benfica e de tão "benfiquistas" que são, vêm para a praça pública lavar a roupa suja da sua intolerância passando a imagem da subserviência a outros "senhores".
Já que não podem ser sérios,no mínimo,sejam benfiquistas de alma clara.
Resposta à sua pergunta: não faço a mais pequena ideia. Sei que este blogue tem o objectivo bem vincado no subtítulo - acompanhar o tal aproximar de Outubro. Isto implica apresentar propostas, ver o trabalho feito, analisar opiniões, et cetera. Não me chame, por favor, anti-Vieira: sou novo demais para ter consciência de um presidente melhor. E, mesmo que me opusesse a todas as decisões de Vieira - que não é o caso e, mesmo assim, seria diferente de estar contra a pessoa que ele é - teria todo o gosto em discutir as opiniões diferentes: gosto de discutir, sem que isso implique inimizades ou nascimento de algum mal. Se são discutidas duas propostas, a melhor sairá a ganhar...
EliminarPor exemplo: não percebo o que significa ser um "benfiquista de alma clara" e não concordo que esta entrevista expresse só falta de ética profissional, e teria todo o gosto em ver esclarecidos estes pontos pelo senhor. A entrevista exprime uma tese central que vem a ser discutida há muito: a presença de pessoas que não são benfiquistas nos cargos directivos. Era isso que mais gostava de discutir...
Obrigado pela visita, volte sempre
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ResponderEliminarhttp://piratasvermelhos.blogspot.com/
Por favor visite e divulgue.
Obrigado
Podemos duvidar e tecer as mais ambiguas e disparatadas teorias da conspiração, mas uma coisa é certa: uma SAD não é uma SA. É certo que o Benfica mais se assemelha a uma SA, mas esse D significa e implica paixão, entrega e algum irracionalismo (leia-se promover as conquistas desportivas em detrimento do plano financeiro, com a moderação que permita equilibrio económico-financeiro) que um adepto de outro clube qualquer nunca terá.
ResponderEliminarMas enfim, isso não interessa nada, somos tricampeões nacionais.....ah, espera, enganei-me, fomos campeões em 2009/2010 e nos dois anos seguintes fomos humilhados.